A Intensa Humanidade

por Oscar D’Ambrosio, São Paulo, São Paulo

O escritor brasileiro Murilo Mendes , em Carta geográfica, cita o dramaturgo grego Sófocles, quando este diz “Muitos são os prodígios; entretanto nada é mais prodigioso do que o homem”. Essa máxima clássica retomada por um dos maiores dos nosso poetas surrealistas indica bem o universo mental que está nos trabalhos gráficos da artista.

Nascida em Santos, em 16 de setembro de 1964, teve seus primeiros contatos formais com desenho de observação e de gravura em cursos gratuitos oferecidos pela prefeitura de sua cidade natal. Nesse momento, a gravura – expressão artística preferida pela artista – funcionava inicialmente como uma mera possibilidade de multiplicação da capacidade de desenhar, não como um processo em si mesmo.

Gradualmente, a consciência técnica foi se desenvolvendo rumo ao trabalho estético realizado hoje, que apresenta uma poética da figura humana marcada pela sensibilidade e pela economia de recursos. Isso não significa uma trajetória rumo ao abstracionismo ou à redução da presença da forma humana, mas, pelo contrário, de um processo artístico em que a imagem resultante do trabalho é carregada de humanidade.

O amadurecimento da artista caminha em consonância a cursos realizados. Com habilitação em Artes Plásticas pela Faculdade de Artes Plásticas de Santos (Unisanta), onde hoje leciona, Márcia fez cursos de extensão em desenho e História da Arte, pós-graduação em Arte Design e cursa atualmente mestrado no Instituto de Artes da UNESP, em São Paulo.

Essa faceta de pesquisadora, porém, não inibe a sua produção artística. Pelo contrário, enriquece a sua visão de mundo, marcada, em termos artísticos, pela presença constante de elementos de densa humanidade, seja um senhor lendo um jornal sentado sobre uma caixa de madeira vazia, figuras de anciãos ou de fetos e crianças, a temática mais recente de Márcia.

Premiada no Brasil e no exterior e com trabalhos participantes em diversas mostras e em acervos de gravura fora do País, a artista santista, como o filósofo Protágoras, aponta que “o homem é a medida de todas as coisas”. Isso é visível em seus trabalhos, desenvolvidos em diversas técnicas, mas principalmente nos de ponta seca.

A citada imagem do homem lendo jornal sobre um caixote, repleta de poeticidade, é, por exemplo, uma calcogravura. Mais importante do que a técnica em si mesma e as possibilidades de interpretação que ela oferece, é a forma como o receptor se relaciona com a imagem.